sábado, 31 de maio de 2008

Agulha de Salvação - Carta ao leitor - Jéssica Campos


Pessoal, é aqui se encerra mais um conto. Como disse no conto passado
o blog está cheio de surpresas e novidades.

Como vocês puderam perceber estamos deixando os contos um pouco mais fortes e mais chocantes, não só para dar ênfase ao título, mas para mostrar que a violência existe, por mais estranha e absurda que ela possa ser.

O Agulha de Perdição foi um conto inspirado após uma leitura machadiana. O sadismo é realmente uma coisa notável, mas ao mesmo tempo passa despercebida. Pessoas sádicas são mais comuns do que imaginamos. Agora se elas saem serrando pernas eu não sei. Hahahaha.

Quero muito agradecer ao pessoal que tem acompanhado meus contos e o blog, e quero avisar que preparei junto com um grande e querido amigo uma grande surpresa para nossos leitores.

Grande abraço, Jéh.

Não à violência, que ela não passe das páginas de um livro.

Agulha de Salvação - Parte VI - Jéssica Campos

O serrote passava rasgando tudo em seu caminho, músculo, pele, osso e até mesmo a corrente de sangue que o torniquete não conseguira segurar.

O osso havia sido serrado quase que completo, mas o rompimento do nó que prendia o torniquete não estava nos planos.

Na mesma fração de segundo, quando Nora quebrava com as próprias mãos o osso de Julia o nó se desfez.

O sangue jorrava vivido e brilhante. Em um minuto e meio a pequena Julia de sete anos, habitante do bairro sujo em que os Delle moravam, estaria morta pela escassez de sangue.

- Pet me ajude. Ela não pode morrer agora. Ainda não. - Disse Nora.

Ele não se movia. Continuava em sua poltrona, no seu ângulo imóvel, diria, se não fosse pela movimentação dentaria buscando pelo lábio a ser mordiscado.

- Levanta daí seu desgraçado e faça algo. Estou ensopada e minha blusa nova está ficando manchada com esse sangue.

Tão sereno como antes, Peter levantou-se calmamente olhando a menina ter seus espasmos e a mulher ensopar-se. Pegou a seringa que estava sobre a penteadeira e, como se uma música lírica tocasse no ar, ele deslizou até a cabeceira da cama.

- Calma pequena Julia. Vou te ajudar. - Disse Pet, calmo e gentil.

Com os olhos mais verdes que o comum passou a agulha pelo pescoço suado da menina. Por um momento pensou não ter cortado, mas o sangue escorrendo por sua garganta foi arrombando o fino corte, cessando suas dúvidas.

- Nossa... Essa foi realmente excitante. - Dizia Nora enquanto se limpava do sangue no rosto.
- O que fizemos? - Perguntou Peter. - Não era pra ser assim.
- Acalme-se. - Era notável a impaciência e indiferença na voz de Nora. Era apenas uma menina porcalhona.

Na manhã seguinte quando os pais de Julia vieram ao seu encontro, não acharam sua pequena e suja Julia Carter, e sim uma menina esturricada, gelada e sem perna, com um fino corte na garganta.

Os Delle? Com absoluta certeza deviam estar se estabelecendo em uma cidade qualquer, com um bairro sujo, cheio de pessoas pobres que necessitam da ajuda de dois advogados maravilhosos.

"Aqui jaz Julia Carter. Amada filha."

sexta-feira, 30 de maio de 2008

Agulha de Salvação - Parte V - Jéssica Campos

Os dias foram passando e a perna não melhorava, pelo contrário, uma visível infecção instalava-se sobre a ferida ainda aberta. Nora havia retirado os curativos de Julia com o pretexto de que sua perna necessitava de ar fresco.

Nora e Peter pareciam lobos famintos em cima do ferimento, que começava a demonstrar os nervos saltitantes.

- Ela irá perder a perna se continuar assim. - Dizia Nora sem se mostrar aflita, mas sim um pouco falsa por fingir se preocupar com isso.
- Eu sei... Vamos poupá-la. - O sadismo era quase visível na expressão de Peter.

Talvez se Nora não estivesse tão compenetrada em sua farsa, poderia perceber tal detalhe.

Julia tinha um sono leve por natureza, agora com um ferimento que latejava, era quase impossível vê-la dormindo.

"Nada que uma picada não resolva."

Dito e feito. Apenas uma picada. A dor de Julia se resumiu a picada da agulha. Um remédio qualquer, comprado em uma farmácia qualquer de um bairro qualquer, foi sua salvação ou a sua perdição.

"Está parecendo um filme de terror."

E realmente parecia. A chuva parecia castigar a todos, trazendo consigo trovões que amedrontariam qualquer criança que não estivesse dopada.

Seria simples e rápido.

A melhor maneira seria fazendo um torniquete. Um bom pedaço de corda, bem apertado um pouco acima do ferimento. Um corte preciso e ela estaria salva da infecção que consumia sua perna.

Um serrote, panos e mais remédios caso ela sentisse dor.

Falar que foi algo simples é mentira. Nora teve que perder a delicadeza e colocar a mão na massa. Nem luvas, nem cabelos presos nem nada. Algo bem caseiro e amador.Do outro lado do quarto, em um ângulo bem pensado, Peter observava o esforço da esposa e a demência de Julia.

terça-feira, 27 de maio de 2008

Agulha de Salvação - Parte IV - Jéssica Campos

Os machucados eram marcantes nas festas de Peter. O choro sentido da criança produzia um som agudo fazendo o ar ser preso nos pulmões, tendo que segurá-lo por uma quantidade de tempo até que considerável. A liberação do ar vinha com lágrimas grossas que desciam de uma vez até a boca, passando pela secreção que escorria do nariz, trazendo uma mistura salgada até os lábios.

- Oh! Você se machucou pequenina?

Com a dor de ter tido uma fratura externa na perna, Julia mal conseguia chorar, o que diria responder o que era óbvio.

- Não se preocupe pequenina, tio Pet irá cuidar de você. - Carinhosas eram tais palavras... Verdadeiras era outro quesito.

A pequena Julia, morena, de nariz empinado estava com seus olhos grandes e escuros como jabuticaba, cheios de temor e lágrimas. O sangue de sua pequena perna mirrada escorria entre o fêmur que havia se partido ao meio.

- Realmente isso deve estar doendo. Você ficará em minha casa até sua perna sarar.

A vinda médica demorou algum tempo, quase acarretando a Peter o dever de estancar o sangue, já que Nora estava ausente. Enquanto Julia chorava a mistura de terror e dor, Pet observava-a com um olhar sereno.

Mal podia se mexer, podendo relaxar seus nervos simplesmente com algumas gemidas, fazendo o sangue manchar todo o lençol onde estava deitada.

Após uma atadura porca e uma limpeza bem mal feita, José, grande amigo e médico da família, retirou-se da propriedade Delle, deixando apenas uma piscadela a Peter.

- Fique tranqüila pequena Julia, já conversei com seus pais e eles mesmos acham melhor você permanecer aqui enquanto sua perna está... Deformada? - Ria Peter - Brincadeira... Quebrada.

Aquelas palavras serviram apenas para o choro retornar à face infantil e ingênua de Julia, que mal sabia o que lhe aguardava.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Agulha de Salvação - Parte III - Jéssica Campos

Os pais inteligentes do bairro não ousavam questionar a fétida família Delle. Afinal Peter e Nora prestavam favores à comunidade.
Quando o pobre Delfino assassinara a mulher com uma garrafa de álcool e uma caixa de fósforos após descobrir sua infidelidade, Peter fora seu advogado e conseguira provar ao juiz a inocência de tal homem, alegando que sua esposa o havia atacado com uma faca.

"‘Meritíssimo tendo em vista as provas apresentadas neste tribunal, pode-se alegar que meu cliente agiu em defesa do filho e própria já que sua esposa mostrou-se mentalmente perturbada. ’

"Delfino olhava confuso para Pet. Não havia acontecido nada daquilo. Ele simplesmente chegara bêbado em casa, e após estuprar e espancar a esposa queimou-a.

‘Mentiras burocráticas meu velho não se preocupe. ’

‘Mas senhor... Não foi isso que... ’

‘É isso ou cana, velhote - Respondia Peter agressivamente. ’ "

As festinhas eram realizadas com a desculpa de presentear as adoráveis crianças por serem obedientes com o "tio" Pet.

Sem poderem dizer algo, os pais autorizavam seus filhos a participarem, e mesmo se não permitissem o próprio anfitrião ia buscá-las. E fazia questão de lembrá-los de alguns favores.

Pet não abusava sexualmente delas, muito menos Nora o fazia. O seu desejo por elas provinha de outro canal mental.

As festas dos Delle não eram totalmente seguras e como todas e quaisquer crianças que adoram brincar em festinhas, as daquele bairro não eram exceção. Grandes camas-elásticas sem rede de proteção com grandes e grossas molas ficavam à mostra e fazia parte do entretenimento das crianças. Os monitores que deveriam fiscalizar a utilização do brinquedo estavam ausentes, pois Peter dizia serem inúteis. Com a empolgação dos grandes saltos e piruetas, era fácil ocorrer um acidente.

domingo, 25 de maio de 2008

Agulha de Salvação - Parte II - Jéssica Campos

"Ela realmente sabe como provocar. Vadiazinha... Dar-lhe-ei o que merece."
- Venha Pet, deixe-me relaxar seus músculos.
- Claro querida, sou totalmente seu. - E com um movimento rápido e ao mesmo tempo brusco ele encaixou-a entre as pernas. Realmente não parecia uma posição amorosa ou algo do tipo, vendo que Pet estava prensando-a entre as pernas.
- O que está fazendo Peter Delle?
- Você acha que é assim? Depois de tudo o que fizemos tudo ficou fácil para você? Uma noite de sexo... Só isso?

Nora não queria falar sobre aquilo. Não agora. Havia passado a tarde inteira debruçada sobre uma maldita mesa de marfim, olhando papeladas burocráticas sobre os casos mais ridículos e inúteis do mundo, enquanto o idiota de seu patrão a observava e cobiçava descaradamente seu corpo. Estava na hora e ela sabia o que tinha que fazer. Isso era sempre rápido, afinal ele era um velho que mal se agüentava em pé. Esse era o preço da beleza... E das promoções.

Peter a virou de bruços e penetrou-a com muita força. Ao mesmo tempo em que tinha vontade de matá-la, amava-a. E como era parte daquela família contraditória, a maneira que demonstrava ambos os sentimentos era daquele jeito.

- Você me ama No?
- O que isso importa? - Dizia Nora sem ar em meio aos gemidos de cada investida do marido.
- Muito! Ama ou não?

Por um momento ele parou. Pensou no que havia feito com sua vida e com a de Nora.

Há um mês, eles eram o casal mais próximo do normal daquele bairro imundo e nojento. Passeavam de mãos dadas e sorrindo para todos.

Peter era um rapaz forte e alto. Tinha olhos verdes como de quem acabara de sair do inverno e adentrava em uma quente primavera.

Seu desejo paterno era visível. Adorava brincar com as crianças emporcalhadas e deformadas do bairro. Promovia várias festas infantis em sua casa, estas que Nora fazia questão de não participar, já que ansiava pelo corpo idealizado que a mídia expunha.

sábado, 24 de maio de 2008

Agulha de Salvação - Parte I - Jéssica Campos

"A corrupção se torna cada dia mais eminente. A justiça que tanto alegava possuir como prioridade a proteção social é uma das primeiras a se corromper."

- Hum... Quanta bobagem essa televisão transmite. Eu sou um exemplo nato no ramo da advocacia. Em toda a minha vida nunca coloquei um inocente na cadeia e tenho que escutar que a justiça está fraca.
- Falando sozinho meu amor? - A ironia era evidente em sua voz.
- Ah! Oi querida, não a tinha visto entrar. Como foi seu dia?
- Exaustivo. Não quero falar sobre isso. Venha, vamos fazer amor.

A família Delle era uma família contraditória. Possuíam uma bela casa na Rua da Perdição, que como o próprio nome já diz era uma perdição. Suas casas, com exceção da dos Delle, eram pobres e velhas. Janelas antigas, empoeiradas com o desdém da vida e da sujeira impregnavam na decoração urbana.

As pessoas não eram tão diferentes de suas casas. Algumas bem mais arrumadas usavam suéteres de lã. Em compensação, a miséria era um tanto quanto eminente naquela pequena parte do todo, que era a cidade de Montes.

A vizinhança tinha uma "afinidade" especial pela família Delle. Nora era uma mulher finíssima e suas sobrancelhas escuras denunciavam o falso loiro do cabelo curto e sedoso. A face era branca contendo um pequeno lábio vermelho. Era realmente linda. Porém, nem toda beleza é sutileza, e por mais fina que fosse Nora não era uma mulher sutil.

Como os Delle eram mais afortunados na questão social, procuravam ajudar aos vizinhos, pois qual bom advogado não faz mercado com os pobres vizinhos problemáticos e fofoqueiros?

Peter já havia cuidado de alguns casos na vizinhança. Alguns assassinatos básicos, matar ou morrer, como ele mesmo rotulava.
Havia colocado grandes bandidos na cadeia e em cima de tal fama construíra seu império vocacional, mas a verdade é que os bandidos eram quem eles, os poderosos, decidiam.

- Você não disse que estava exausta?- O que isso tem haver? - Dizia Nora enquanto se despia, deixando a vista seus fartos seios claros.

quinta-feira, 22 de maio de 2008

A Resistência - Carta ao Leitor - Renato Seabra

Este conto faz parte de uma história que montei. Benjamin é aí o personagem principal em confronto com Elias, personagem principal de meu conto anterior "Mudanças de Vida".

Para mim, escrever essa história foi, de certa forma, muito divertido, devido às estratégias que Benjamin utiliza para realizar seus serviços ou para esquivar dos problemas que Elias lhe causou.

A ilustração deste conto ficou excelente. Gostei muito do trabalho que Daniel fez. Espero que tudo continue progredindo.

Até a próxima.

-- Renato Seabra



A Resistência - Parte IV - Renato Seabra

Benjamin explica que o que ele tinha lá era apenas uma arma muito antiga e sem munição, era praticamente um brinquedo. Disse, também, que nunca daquela distância conseguiria acertar alguém, mas revela, após muita pressão, sendo torturado e não suportando as ameaças, que havia alguém mais perto que atirou. Ele disse que essa pessoa só precisava de uma chance para realizar o serviço.

Elias foi interrogado sobre isso, e ele confirma que duas vezes que acompanhou os assassinatos, tinha certeza de que os tiros saiam pela janela dele, e não de outro lugar.

A mulher revela que ela havia combinado com Benjamin para matar o marido, pois este a espancava demais quase todos os dias. Já fazia parte de um plano, mas não soube explicar sobre o que Benjamin disse sobre outro homem estar mais perto para fazer o serviço.

Benjamin foi novamente interrogado sobre a mulher já ter combinado com ele o assassinato. Ao que ele disse que somente dava mesmo o sinal para a mulher ir embora assim que ele jogasse pela janela um pano com uma cor. Que era o combinado da mulher aparecer no bar no dia seguinte e só dar um sinal de que estava tudo bem.

A mulher admitiu estar preparada para ver a cor do pano, por isso que não fugiu, pois esperava o sinal e Benjamin não havia jogado o pano pela janela.

Benjamin não aceitou contar sobre a outra pessoa. Ele foi condenado à prisão, mas liberado com pagamento de fiança e até mesmo diminuído a pena por não conseguirem mais provas para o assassinato.

Ao chegar ao seu apartamento e abrir a porta, ele vê uma mulher amarrada a uma cadeira, gemendo de dor e chorando. Está com um vestido azul. Benjamin, já prevendo isso, não reage. Abre os braços, mantendo a mesma calma. Três pessoas encapuzadas aparecem diante dele.

Ele não perde a calma, simplesmente continua lá de pé com os braços abertos. Dois deles correm pra cima dele e ao encostarem-se nele, são queimados por choques elétricos vindo dos cantos das paredes.

"Vocês são os primeiros que mato sem receber um centavo."

Ele havia puxado um fio com o braço esquerdo. Ele puxa o outro com o braço direito e uma descarga elétrica percorre toda a casa. Estranhamente seu corpo não recebe nenhuma descarga elétrica. Então ele junta um fio com outro e a corrente elétrica não pára de correr entre todos eles.

A mulher é a primeira a morrer, os três homens tentam correr, mas são enfraquecidos pelo choque, dois deles morrem grudados por causa da intensidade do choque. Os vidros do apartamento estouram, a energia do prédio cai.

Benjamin sai de seu apartamento, fechando a porta e trancando-a. Deixa a chave no chão mesmo, para alguém abrir futuramente e ver do que ele é capaz de fazer. Descendo pela escada, tranquilamente ele segue com uma lanterna. Há muita confusão em todo o prédio. Pessoas correm para todos os lados.

Ele promete ir atrás de Elias, e este é requisitado pela polícia a continuar trabalhando.

FIM


quarta-feira, 21 de maio de 2008

A Resistência - Parte III - Renato Seabra

Elias chega ao apartamento em que mora e observa a rua. Tira sua arma do bolso e parece estar se preparando para algum ritual.

Alguém está andando na rua! Ele olha assustado e atencioso. Mas é apenas uma família típica como sempre. Marido e mulher abraçados e filhos à frente. "Que hora mais perigosa para se ficar na rua, mas não tem outro jeito" Elias pensa, parecendo preocupado com alguma coisa.

Ele pega um cigarro, ascende e começa a fumar. Fuma um. Fuma dois. Dois maços. Pega um binóculo. Olha pra rua. Vê algumas pessoas andando na esquina do quarteirão e no meio, descendo a rua, um casal típico como todos os outros daquele bairro. Uma mulher sendo agredida por um homem. Elias se prepara pegando sua arma. Pega também seu celular e o deixa do lado, preparado para uma ligação para a polícia.

A mulher que está sendo agredida pelo homem consegue se defender, dando um tapa no rosto dele e, em seguida, o empurra para o chão. Nessa hora, aquele tiro certeiro, como todos os outros, não falha. Elias não esperava isso da mulher e que o tiro seria tão rápido. É muito difícil as mulheres reagirem na força. Rapidamente Elias liga para a polícia.

Ele então corre para o andar de cima do prédio. O atirador não deveria ter sido tão rápido e o plano de pará-lo poderia falhar e nunca mais haveria outra chance. Elias mora no oitavo andar. Arromba a porta da sala do nono andar. E no meio da escuridão total, está Benjamin ainda com a arma apontando para a janela e com um pano azul na outra mão. Benjamin se mantém calmo, ergue seus braços lentamente, mas sabe que não pode se mover muito, sendo que Elias está apontando sua arma para ele.
- Então... Era você o tempo todo? - Pergunta Benjamin.
- Sim... - Responde Elias. Você já sabia, não é?
- Claro. Apenas não te matei porque não queria levantar suspeitas.
- Está certo. Mas, acho que isso acabou pra você.

Tempo de silêncio e análise.

- Não acho que você seja um policial ainda.
- E não sou mesmo. Mas estou aqui os ajudando para te impedir.
- Estranho não querer me matar. Não seria melhor ou mais prazeroso? Entende algo sobre prazer?
- Como eu gostaria de me vingar mesmo do que você me fez aquele dia... Mas eu mudei. Você me ensinou como eu estava sendo idiota agindo daquela maneira.
- Sim, e ensino a muitos como você quase todos os dias. Além de ganhar para fazer isso.
- Não importam seus motivos. A polícia já está chegando e você será preso.
- Não serei preso. Pensa que eu não tenho saídas preparadas para essas situações?
- O que pretende fazer? Se você se mover...
- Deixe-me perguntar primeiro uma coisa. Tem testemunhas?
- É óbvio que sim. Combinei com uma família de ficar lá embaixo, fora da sua vista, para filmarem o ocorrido.
- Hum...Eu os vi descendo realmente há alguns minutos. Será que registraram certo?
- Como assim?

Celular toca.
- Elias falando...
- É o seguinte... Não foi Benjamin quem o matou...
- O que? Como assim não?
- É... É... - O policial do outro lado está também surpreso - A polícia chegou aqui e a mulher não fugiu ainda.
- Por que a mulher não fugiu?
- Ela foi detida... Não fugiu...

Elias fica em silêncio, apenas olhando para Benjamin.

- É complicado explicar. A polícia está subindo aí... Mantenha o Benjamin aí...
- Está... Está certo...
- E ai? - Falou Benjamin - Descobriu a verdade sem eu precisar falar então...?
- Você não vai escapar tão fácil dessa. Eles estão subindo.

A polícia chega. Benjamin permanece ali mesmo. Eles checam a arma. Não é uma arma. Elias vê o que é e não acredita. Levam Benjamin e mulher presos para serem interrogados.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

A Resistência - Parte II - Renato Seabra

Outra noite. Outro homem passando pela rua espancando outra mulher. Uma visualizada pela janela e alguém prepara sua arma.

O prédio realmente parece seduzir muito os olhos tanto de ricos como de pobres. Não dá para entender como as pessoas mudam diante dele. E apesar de ser assim tão desejado como moradia, é um prédio com muitas vagas. São poucos os que podem pagar para viver lá. E isso forma quase a mesma quantidade daqueles que tem a coragem de perguntar os preços.

O atirador espera por uma chance. Assiste à cena, se diverte um pouco. Ouve alguns palavrões. Ouve alguns gritos. Mas não distingue muito bem sobre problemas sexuais e psicológicos que a mulher parece falar de seu marido. "Bom, mas por que isso importaria sobre ele, se ele está morto?". Ele engatilha. Aponta na janela. Mira corretamente. O cara parece estar parado. Aperta o gatilho. A bala percorre seu caminho, determinada. Perfura a cabeça do rapaz. Todos os atores, desde o atirador até a bala, cumprem seus devidos papéis que lhe foram concedidos e é mais um dia de uma morte justa e um trabalho bem feito.

Um pano vermelho é jogado pela janela.

A mulher se desespera, tenta chamar atenção de alguém, mas rapidamente sai correndo atrás de ajuda e some da vista de qualquer morador do prédio e provavelmente de qualquer morador da cidade acordado naquela hora.

Ligam para a polícia e eles demoram outra hora para chegar.

Outro corpo é levado sem saber os motivos da morte. Pelo menos é o que se parece.

Investigadores estão notando a precisão dos tiros e não acreditam que estão lidando com um novato. Eles confiam nos planos que possuem já em execução.

Há um homem no mesmo bar. Ele está vestindo um boné de jovem e roupas estranhas. Não se cuida muito bem. As garçonetes prendem sua atenção a noite toda, o que não é recíproco. Está bebendo muitas cervejas e fumando alguns cigarros. "Esse cara... Não muda mesmo" Alguém pensa.

Esse cara se chama Elias.

Uma mulher entra no bar com um vestido vermelho e longo. Ela é mais bonita que a de amarelo que se encontrou com ele vez passada. Mas esta está acompanhada de quatro amigas. Todas vestidas com pouca roupa e uma delas machucada no rosto, nos braços, nas pernas e nos seios. Sorte o cabelo estar apenas desarrumado. Eles conversam cochichando. Elias tenta ouvir algo sobre o que está acontecendo ali, mas não consegue. Olha para o garçom. O vê prestando atenção no grupo que se formou ali, mas está trabalhando sem tentar mostrar a curiosidade.

Elias dá um último trago em seu cigarro, bebe um último gole, e dá novamente outro último trago em seu cigarro. Uma última olhada no bar, no grupo, nas garçonetes, na porta e de volta nas garçonetes. Sai do bar e volta para onde mora.

domingo, 18 de maio de 2008

A Resistência - Parte I - Renato Seabra

É quase uma hora da manhã quando um casal está andando por uma rua bem iluminada da cidade. O problema é realmente a boa iluminação, devido à facilidade que os bandidos encontravam para fazer seus assaltos. A polícia não passava com muita freqüência por ali, sendo uma região quase que fora do mapa.

O casal sabe que não pode fazer muito barulho. Mas de repente, o marido começa a agredir a mulher após esta simplesmente parecer ter feito uma brincadeira de mau gosto. O homem bate nela até derrubá-la ao chão.

O que é de destaque nesta rua é a vista até um apartamento muito bonito que fica do outro lado. E o que o casal não sabe é que estão sendo observados do nono andar por uma pessoa.

Qualquer um que passava por ali podia ver o que estava acontecendo. Não há muitos prédios ao redor que impeça a visão. As pessoas que passavam de carro ou de moto por ali simplesmente ignoravam a situação. Indiferença é a única coisa que bloqueia a visão das pessoas mais do que qualquer outra coisa.

A pessoa que está espionando diz a si mesma que "Esse vai morrer..."

O marido, que espancava sua mulher, saca uma faca e ameaça cortar seu pescoço. Ela grita por socorro.

Somente um disparo. Direto na cabeça. Pega em cheio o cara. Este cai morto sem o mínimo de reação, senão por algumas contrações de seus dedos tentando, inutilmente, segurar sua faca como se segurasse a um rosário, clamando por Deus para continuar vivendo.

A mulher tenta entender como aquilo aconteceu, mas se desespera e sem saber o que fazer, sai correndo. Um pano amarelo é jogado pela janela e suavemente vai descendo seguindo uma corrente de ar fria até chegar ao chão.

O cara do prédio pega seu celular e liga para a polícia, falando para eles fazerem uma visita perto do hotel, devido a ter acontecido um assassinato e desliga.

Uma hora depois o corpo é levado, mas ninguém sabe explicar o que houve. Pelo menos era o que alguém pensava ou esperava que alguém pensasse assim.

Num bar, com alguns bancos de couro, boa luz, garçom no meio de todos e algumas garçonetes andando e entregando alguns pedidos, há um cara sentado quase no meio das mesas. Está bebendo alguma coisa que ele está cobrindo com as mãos.

Tem roupas normais como de todos, exceto por seu casaco antigo, longo e preto e uma bota estranhamente enorme, parecendo feita puramente de borracha. "É óbvio que está escondendo alguma coisa." É a primeira impressão que ele passa para qualquer pessoa. Esse cara se chama Benjamim.

Ele está muito calmo. Parece ser assim no seu dia a dia.

Sem ao menos mover o rosto, percebe uma mulher chegar até ele. Ela está vestindo um vestido muito curto, amarelo chamativo. É morena e está muito maquiada. Ela tem cabelos grandes num estilo anos 80. Seu rosto parece estar um pouco inchado.

Ela pisca pra ele, ao que o faz balançar a cabeça querendo dizer que entendeu o recado. Ao olhar para o garçom, este logo volta a trabalhar, pois estava prestando atenção ao que acontecia naquele momento.

Benjamin termina sua bebida. Uma garçonete passa por ali e recolhe seu copo, rebola seu corpo. Ele a observa atentamente, mas sem muito tempo para brincar agora, se levanta e vai embora.

sábado, 17 de maio de 2008

Stella - Carta ao Leitor - Paulo Costa


Caros leitores, espero que estejam apreciando os humildes contos aqui postados, pois estamos tentando, de maneiras diversas, transformar o nosso Blog não só em um "banco de contos", mais também em um ponto de encontro para os fãs do gênero.

Este meu novo conto, Stella, é uma homenagem a uma música da qual aprecio muito! Aliás, se não fosse a música tocando incessantemente em meus ouvidos, eu não o teria concluído!

Quer saber o nome da banda e o nome da música? Não digo.

Há!

Apesar de bem curto e como alguns podem dizer, com um "leve toque Shakesperiano", espero que tenham gostado!

Até o próximo conto e que venham mais!

;D

-- Paulo Costa

Stella - Parte III - Paulo Costa

Stella nem ao menos se moveu. Nem ao menos respirou. Estava morta.

- Eu não queria que as coisas tivessem saído desse jeito... - Disse Carlos, com lágrimas nos olhos. - Você deveria ter me amado ao invés de procurar em outros braços, solução para os seus desejos. Eu estava lá. Eu sempre estava.

As imagens iam e voltavam na cabeça de Carlos. O barco virando junto com os dois. O frio cortando seus corpos. Stella lutando para permanecer na superfície, não que não soubesse nadar, mas lutando contra ele mesmo, Carlos, seu marido, que estava fazendo com que ela permanecesse submersa tempo suficiente para que esquecesse tais pensamentos e finalmente, parasse de respirar. Para sempre.

- Eu te amo, Stella. - Disse Carlos, mais uma vez, em meio a muitas lágrimas. - Hoje nos tornaremos um e finalmente viveremos eternamente juntos, como deveria ter sido desde o inicio. O meu amor por você é infinito.

Ao dizer estas palavras, Carlos levou sua mão direita até o bolso de sua camisa e puxou um pequeno pedaço metálico, refletindo todo o azul diretamente em seus olhos. Uma lâmina.

- Feliz... Nono... Aniversário... - Disse Carlos, respirando com dificuldade em meio a tantas lágrimas, levantando uma das mangas até o cotovelo.

Deitou-se sobre os seios de Stella e lentamente, fez o primeiro corte no pulso esquerdo, derramando sangue quente sobre estes, há muito tempo frios e já pútridos.

Carlos não gritou, nem ao menos sentiu. Estava fazendo tudo o que tinha planejado durante dias. A sua última prova de amor. Estava certo que Stella entenderia e o perdoaria. Cortou mais uma vez.

Sentiu cada um de seus sentidos se apagando, lentamente, um a um. Estava feliz, finalmente nada atrapalharia a felicidade dos dois. Nada.

- Stella... Eu te amo...

Então, Carlos sentiu as trevas engolirem os seus últimos sentidos, levando-o daquele mundo onde não poderia, em hipótese alguma, viver sem a sua amada.

FIM

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Stella - Parte II - Paulo Costa

As grandes portas de vidro que davam acesso a um belo jardim, muito bem cuidado, estavam abertas, deixando entrar um vento gélido e luzes de tons azuis, que iluminavam o jardim. As cortinas brancas, lisas e leves, esvoaçavam suavemente como se apontassem para ela, Stella, deitada próximo à borda da cama, envolta em um lençol igualmente branco, como sua pele, que refletia o azul das luzes do jardim, dando um aspecto de sonho, surreal, àquele cenário.

O lindo vestido, em tons de vermelho escuro, estava perfeitamente pronto e arrumado, sobre uma das elegantes poltronas ao lado da cama do casal, para que ela o vestisse.
Carlos se maravilhou ao encontrar a sua amada esposa ali, em um sono profundo e sereno. Nunca se cansava de observá-la. Seus olhos brilhavam como duas pequenas estrelas no meio de todo aquele tênue azul difuso. Andou até a poltrona e acariciou levemente o tecido do vestido. Como era macio.

Teria que acordar Stella, mais cedo ou mais tarde, e porque não gentilmente, colocando o vestido sobre sua pele nua?

Aproximou-se da cama com o vestido nas mãos e começou a retirar o lençol que a envolvia, lentamente.

A luz azul, agora formava uma única sombra na parede lateral do quarto, como uma pintura, uma obra de arte, mostrando as curvas perfeitas da mulher que, para Carlos, era a mais perfeita de todas.

Deslizou o vestido leve como uma pluma sobre o corpo de sua amada e deu-lhe um beijo na ponta dos seus lábios. Ajoelhou-se ao lado da cama e retirou novamente a foto, que tiraram à beira do lago.

- Eu te amo, Stella. - Sussurrou, acariciando o rosto rosado de uma Stella sorridente, registrada para sempre em uma fotografia. - Eu te amo.

A viagem até o lago, fora um presente de seu chefe, que vendo o esforço e a dedicação de Carlos, resolveu dar-lhe alguns dias de descanso em algum lugar longe dos grandes centros comerciais e preocupações com os negócios. Exatamente como Carlos apreciava.

Em uma das tardes frias, passeando pelo lago, remando um velho barco, Stella pediu para Carlos que parasse por alguns instantes, para que pudesse lhe dizer algo importante. E ela assim o fez.

- Porque teve que dizer tais palavras, minha amada? - Perguntou Carlos, em um tom calmo e delicado. - Porque justamente agora, próximo do nosso nono aniversário de casamento, em um momento tão maravilhoso de nossas vidas?

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Stella - Parte I - Paulo Costa

Fazia uma tarde maravilhosa. O céu estava azul e os pássaros cantarolavam suas belíssimas canções. Não se importaria de ter que trabalhar duro para satisfazer os desejos de sua mulher, se tivesse sempre tardes como aquela. Tardes em que o sol poente parece estar ali apenas para ser apreciado, e junto com ele, uma leve brisa de outono, que batia em sua face como um leve toque de seda.

Encomendara com antecedência, em uma das floristas que trabalhavam próximo ao seu escritório, um lindo bouquet de rosas vermelhas, as favoritas de sua amada esposa, Stella.

Estava ansioso para chegar à sua casa. Haviam se passado anos desde que tiveram um jantar romântico a sós. Tinha planejado tudo, cada detalhe, com antecedência. O menu, as flores, as velas, o vinho e até mesmo o vestido que dera para Stella na noite anterior.

O jantar seria perfeito. A comemoração dos seus primeiros nove anos juntos.
O trânsito estava insuportavelmente congestionado, mas ao invés de se estressar como os outros motoristas que o rodeava, retirou tranquilamente uma foto sua com Stella, em seu último passeio, felizes à beira de um extenso lago que espelhava os grandes pinheiros que o circundavam. Apesar do clima não ter sido o desejado, quente e ensolarado, o frio e as volumosas nuvens cinza, transformaram aquele lago e o simples chalé de madeira, no qual estavam instalados, em um lugar muito aconchegante e romântico.

Devido ao congestionamento, chegara a sua casa na total escuridão. Carlos sempre achou melhor morar longe dos grandes centros urbanos, mesmo que para isso tivesse que fazer pequenas viagens até a cidade. Gostava de silêncio e de privacidade.

Guardou o carro e apanhou todos os preparativos que lhe fizeram companhia durante todo o trajeto, no banco de passageiros.

Sem fazer qualquer barulho, Carlos abriu a porta e andou até a cozinha muito lentamente. A surpresa teria que ser perfeita. Prepararia a mais bela das mesas de jantar para a sua amada. E assim o fez.

Apreciou por um momento o que havia feito e ensaiou alguns galanteios diante da mesa, para impressionar Stella ainda mais. Ela sempre dizia que surpresas românticas eram raríssimas nos dias de hoje e, como uma das últimas românticas, sentia falta de tais gestos.

Caminhou para longe da mesa, mas não antes de acender lindas velas ornamentais vermelhas, a cor favorita dela.

Estava um pouco nervoso, poderia até dizer eufórico. Sentia como se estivesse saindo para um jantar a dois pela primeira vez, suas mãos tremiam tanto quanto os seus joelhos.

Parou ao chegar à porta de seu quarto, respirou fundo e a abriu, lentamente.

terça-feira, 13 de maio de 2008

Tradição de Matilha - Carta ao leitor - Daniel Pedrosa


Primeiramente, eu gostaria de agradecer aos leitores que acompanharam nosso primeiro ciclo.

Em seguida, agradecer a confiança de toda a equipe, ao me deixar totalmente livre para ilustrar e lançar meu estilo, na arte do projeto.

Tem sido difícil desempenhar duas funções, a de escrever e de desenhar, porém é muito gratificante ver um projeto, que estava "engavetado", funcionar a todo o vapor.

Do mais, esperem para conferir os novos trabalhos, o nível de escrita e ilustração promete mais daqui por diante.

Obrigado a todos.

-- Daniel Pedrosa

Tradição de Matilha - Parte III - Daniel Pedrosa

- Meu líder, me perdoe. - Sussurrava Dário com uma mordida no lugar que um dia fora sua garganta.

Era quase impossível recordar-se da lembrança de um pelo felpudo e branco ali. A ferida estava espantosa. O sangue jorrava e suas artérias pulsavam para fora. Era realmente um milagre ele ainda estar vivo... E falando.
- Quem fez isso Dário? Interrogava aturdido e confuso o ofegante líder.
-Iúna. Ela comeu... Antes de partir preciso lhe falar...

Agonizando, Dário confessou que Iúna o chamara para as terras a fora do território nativo. Sempre aventureiro, aceitou e partiu com ela nesta arriscada jornada. No aparecer de um caçador humano, Dário o atacou e a protegeu. Mas Iúna avançou no humano e o comeu.

Tomado pela fome e pelo cansaço, Dário também se rendeu a carne humana.
Com o transtorno na floresta, Arísis chegou e o surpreendeu com o humano, enquanto Iúna já havia fugido.

- Ela está bestial... Manáz não vai agüentar...

Arísis não pensava, simplesmente aturdiu-se e correu perdoando Dário, que nesse momento golfava o pouco sangue que lhe restava, deixando a terra tingida com uma poça vermelha. Ouviu os rosnados e sem pensar, saltou pelo arbusto alto que estava em seu caminho, deparando-se, e investindo em sua amada esposa.

Manáz estava esfacelado a cortes feitos com garras afiadíssimas. Mal se agüentava em pé.
Sem demora, Iúna avançou agressivamente em seu líder e marido Arísis, as trocas de golpes eram rápidas e intensas, até que Iúna cegou seu marido em um olho. Apenas ela sabia o dom que Arísis tinha. Apenas ela... Sua cúmplice, companheira, sua vida... Apenas ela sabia sobre seu belo olho azul oceano, em casos de perigo tornava-se verde mata. O que era naturalmente verde, já não mais existia.

Um ódio a consumia por dentro, e Arísis não atacava direito, o único olho que lhe restara transbordava em lágrimas, sua face tinha uma carreira de lágrimas e outra de sangue escorrendo ao mesmo tempo. Manás, seu sábio amigo, mesmo que quisesse nada podia fazer, estava fraco, e como se o vento lhe empurrasse, caiu.

- Eu comi para ficar mais forte. Cansei de ser mandada por machos tiranos!
Cansei de caçar para vocês e não receber nenhuma glória. Fundarei uma matilha de fêmeas que os tornarão escravos!

Arísis não a reconhecia. Apenas tentava ganhar tempo. A cada golpe que o líder defendia, se lembrava dos momentos íntimos, os momentos alegres, seu colo materno que o aconselhava sabiamente, momentos que pertenciam somente a eles, porém, podia ver agora que estes nunca foram os dela e isso fazia com que as lágrimas acompanhassem o sangue que escorria mais rápido agora.

- Não adianta Arísis. Eu estou bem mais forte! - Dizia ela enquanto via o esforço em vão do marido de se libertar e imobilizá-la.

Manáz que respirava fundo, cansado e estendido ao chão, olhava-a profundamente como quem se lembrasse de vidas passadas, e pensava "Que erro eu cometi".
No fundo, Arísis era astuto e se deixava imobilizar de uma vez para um pequeno "bate papo" com aquela que ele um dia acreditou ser amado.

- Antes que acabe com isso me responda algo.
-Diga! Rosnou Iuna ferozmente.
- Nunca me amou? Era tudo mentira?
- Não seja tolo, desde filhote odiava machos, folgados e donos de um poder que não possuem, mas fui esperta, escondi este ódio à vida inteira enquanto criava um plano. Bastaria fazer com que um rei tolo se apaixonasse por mim e o resto viria à tona! Machos, não passam de mero produto reprodutor!

No momento em que ela humilhava seu coração, a matilha havia chegado. Manáz em tom irônico interrompeu sua risada maquiavélica, que pairava no ar como a neblina densa de um pesadelo.

- Se vai matá-lo, faça antes que eles o façam com você.

Ao olhar para trás, Iúna se deparou com o resto da matilha a cercando, todos em guarda, inclusive as fêmeas encaravam-na sem piscar, aproximando-se lentamente. Após a bestialidade que Iúna exerceu, estava cercada, a matilha estrategicamente a encurralou, nem tentara fugir, somente olhava para a matilha, inclusive para Arísis, com um ódio demoníaco. Seu olhar estava em brasas!

Manáz propôs ao seu líder que a banisse, mas apenas após um tempo. Manáz era sábio e viu a lua mudar na noite anterior a morte de Dário, isso era o sinal sagrado da fertilidade.

Iúna esperava um filhote de seu líder e Dário voltaria. Até que isso acontecesse, Iuna seria mantida em cativeiro.

Um tempo depois da carnificina ocorrida, lua crescente dourava levemente o céu. Enquanto Arísis contemplava-a chorando com seu único olho, o que lhe restava. E lembrava-se... Lembrava-se do falso amor de Iúna, o amor que este acreditava ser o mais sincero de todos, que o mantinha tão seguro a ponto de considerar a cicatriz que ficou em sua bela face, um elo com um sentimento puramente ilusório que somente era real de sua parte.

FIM

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Tradição de Matilha - Parte II - Daniel Pedrosa

- Não acha que está se preocupando de mais?

A doce voz de uma linda tigresa despertou a atenção de Arísis.

- Minha bela Iúna, não se pode brincar com certas coisas.
- Relaxe, em todo caso, ele é apenas um. E se realmente acontecer ele será banido.
- Que Gaia te ouça meu amor. Mas... Meu pai morreu pelas garras de seu melhor amigo, que se alimentara de humanos.

Iúna lhe lançou um olhar quente e acolhedor. Mas Arísis com seus olhos diferenciados, admirava os olhos de sua esposa, que o chamava para deitar. Como toda a matilha, Iúna possuía olhos azuis.

O amor naquela noite fez o líder Arísis, esquecer pelo menos por aquele momento, todos os problemas.

O sol havia se levantado a tempo, e o líder acordou com a voz de Manáz contando aos outros tigres sua sabedoria.

- Somos um ciclo! Todos conectados. Assim que um de nós partirmos, nascerá no filho do próximo. E assim por diante companheiros...

Quase nenhum tigre acreditava nisso, mas Manáz pregava piamente que estava se redimindo com Arísis.

Acreditava ter matado seu pai em uma vida anterior. O imponente líder não se importava com isso, pois com tudo, ganhou o melhor dos amigos.

- Desculpe acordar tarde Manáz. Poderia convocar a matilha para o treino de caça?
- Imediatamente senhor.

O treino de caça era antes de tudo, era uma arte. Todos se escondiam para pegar uns aos outros em uma cilada. Caso o alvo percebesse, poderia haver o combate corporal, porém este chegava apenas à imobilização.

O treino começou, e rapidamente a matilha já havia se separado armando suas emboscadas.

Dário se escondeu com talento, e de maneira astuta conseguiu ter Arísis em seu campo de visão.

"Vou provar que sou o melhor". Seu pensamento insistia em provar a todos quem venceria ao mesmo tempo em que lutava contra ele. Porém, um sentimento infernal, começava a tomar conta de si. "Vou avançar na garganta"... Preparou-se.

- Rorrr!

Dário estava deitado com Manáz em cima dele imobilizando-o.

- Hoje não é seu dia Dário. - Disse Manáz inocente e bem-humorado.

Dário procurou por Arísis, mas este não estava mais em seu campo de visão. Provavelmente o barulho provocado pelo ataque inesperado e inocente de Manáz o tivera espantado.

Dário olhou fixamente para Manáz, seus olhos continham uma fúria que somente o inferno felino pode presenciar, e um grande rugido de dor, em poucos segundos tomara conta da floresta...

Arísis ouvia aquilo, conhecia aquele som, aquela sensação. Seu único olho azul esverdeou-se, e isso acontecia apenas quando o caos estava por perto.

O medo, a apreensão, as lembranças do passado de quando presenciou a fatalidade ocorrida com seu pai, os olhos bicolores, um azul, um verde e a mudança repentina de cor ao sentir o perigo. Arísis disparou em corrida.

O cheiro de sangue aumentava. Sinal de batalha nas árvores... Um corpo ensangüentado no chão.


domingo, 11 de maio de 2008

Tradição de Matilha - Parte I - Daniel Pedrosa

- Mas o que você fez Dário? - Perguntava incrédulo o líder da matilha de tigres brancos, Arísis.
- Você queria o quê? Que comesse algum de nós? - Respondia ofegante, com os lábios úmidos de sangue humano.

A matilha dos nove tigres brancos tinha uma lei em que comer carne humana era proibido. Não por compaixão e nem para protegê-los, mas para não serem contaminados com sua bestialidade.
Dário era o tigre mais frio, calado e dono de uma personalidade sombria como uma reflexão na madrugada. Porém, queria se aventurar e conhecer além do território dos nove.

Iúna, esposa de Arísis, o líder, também ardia nesta vontade, mas era obediente as ordens do sábio marido.

- Estarei de olho em você Dário. E qualquer mudança de comportamento, você será banido! - Rosnava irritadiço o líder de olhos bicolores, um azul e o outro verde.
- Espere Arísis. Ao menos deixe Dário se explicar.
- Explicar o que Manáz? Não sou supersticioso! Acredito nisso porque eu vi!

Manáz era conselheiro do líder Arísis. Calmo, paciente e meditativo. Porém, um guerreiro nato se necessário.

Dário estava ficando impaciente. Ele segurava uma raiva estarrecedora por estar sendo julgado, mas sabia disfarçar com maestria. Afinal, não podia dar motivos a mais, para seu carrasco líder prosseguir com seus argumentos.

Manáz caminhou elegante até Arísis, e com seus olhos azuis semelhantes ao oceano refletindo a manhã, e indagou-o sabiamente.

- Meu líder. Apesar de tudo, para qualquer um de nós sempre haverá um motivo para todo comportamento. Não nos custa ouvi-lo.

Arísis respirou fundo acalmando-se. Expirou vagarosamente e relaxou sua face, mudando bruscamente sua expressão.

- Por hoje chega. Vamos voltar... Mas converso a sós com você amanhã, Dário.
- Sim senhor, obrigado. - Respondeu Dário fixando seu olhar em Iúna.

Os nove tigres retornavam ao seu território em silêncio. O ambiente emocional era tenso, todos calados, tímidos e, sobretudo receosos ao líder que expressava terrível seriedade.

Quando chegaram, o sol já havia se posto. Era madrugada azul escura, iluminada pela lua cheia. Arísis contemplava a lua em cima de uma rocha média.

sábado, 10 de maio de 2008

A Dívida - Carta ao Leitor - Jéssica Campos


Bom pessoal, vocês puderam acompanhar um dos meus contos, e em breve irei presenteá-los com outros.

Gostaria de agradecer à Daniel que se propôs a fazer o desenho como idealizei. O Contos de Sangue promete ótimos contos e muita surpresa. Até os próximos contos.

-- Jéssica Campos


A Dívida - Parte V - Jéssica Campos

- E assim foi minha filha, eu matei por você e para você. Fiz tudo isso por nós.

Cátia estava abismada. Agora as coisas se encaixavam. Os xingamentos de concorrente, os comentários de ela ser a dívida e tudo mais.

A tristeza havia sumido, a incredibilidade ficava. O ódio surgia. Como pode uma mãe abusar da filha, prostituí-la, simplesmente por ter feitos erros na própria vida. Cátia não tinha nada haver com os problemas da mãe. Ela já devia para o traficante. E já ia morrer por não conseguir pagar a dívida. Ela foi apenas uma desculpa pra ele assassiná-la. Mas Morete foi mais habilidosa.

- Me desculpe minha filha, eu amo você.
-Você não sabe o que é amar.

Pela primeira vez na vida Cátia deslizava sobre o mundo. Ouvia os urros de dor da mãe, enquanto ela enfiava a faca aquecida no fogão em seus olhos.

Não sentia prazer, nem tristeza... Apenas não sentia.


FIM.


quinta-feira, 8 de maio de 2008

A Dívida - Parte IV - Jéssica Campos

A gravidez só foi notada na hora do parto. As drogas lhe destruíram tanto que era quase impossível acreditar que ela fosse capaz de dar à luz. Estava magra, seus fartos seios estavam caídos e murchos. Em seus olhos resplendia a tristeza de toda uma vida, sem contar as olheras pretas que se estabeleciam em seu rosto. Parece que havia morrido. A única coisa que lhe dava certeza da vida era a criança que ela gerou, mas isso nem ela mesma sabia.

No chão de um cortiço, Morete deu à luz a uma menina. Ela não suportava o fato de ser mãe. Era mais uma boca pra sustentar, e mais pra frente seria mais uma concorrente.

Sem pensar duas vezes, pegou a criança e começou a sufocá-la com um pano. O choro da menina era eminente, ela simplesmente esgoelava. Falar que ninguém ouvia, seria mentir feio, a questão era que ninguém queria o maldito bebê.

Irritado com o choro da criança, o rapaz que lhe trouxera para aquela vida, entrara arrebentando tudo que via pela frente.

Ele a culpava. "Você fez isso por querer sua puta". E pela primeira vez na vida, Morete viu que era matar ou morrer. Não era como uma ameaça qualquer, simplesmente o ódio transparecia daqueles olhos furiosos.

A criança foi deixada de lado, chorando desesperadamente, e isso irritava mais ainda os dois. O que foi feito está feito. Ela teve apenas uma chance e aproveitou-a. Na favela a regra era essa: Matou... Você manda.

Os anos se passaram e ela passou a olhar para aquela criança com outros olhos. Não caro leitor, não foi o olhar maternal, mas sim o olhar de um lobo que espera a presa cair para atacar. Ela sentia vontade de tocar a menina. E ela a tocava. No começo apenas passava a mão, sentia a pele macia de sua filha, sua futura aprendiz, amante e concorrente.

Com os anos a menina cresceu e se tornou uma prostituta habilidosa e lucrativa. Mas o fato de olhar para ela fazia com que Morete se lembrasse de um passado, ou pelo menos uma parte em especial, que ela tentava esquecer. Jurara pra si mesma, que ia fazer aquela maldita menina sofrer por ter nascido e por ser tão bela, despertando nela o prazer indescritível.

Ele a culpava. "Você fez isso por querer sua puta". E pela primeira vez na vida, Morete viu que era matar ou morrer. Não era como uma ameaça qualquer, simplesmente o ódio transparecia daqueles olhos furiosos.

A criança foi deixada de lado, chorando desesperadamente, e isso irritava mais ainda os dois. O que foi feito está feito. Ela teve apenas uma chance e aproveitou-a. Na favela a regra era essa: Matou... Você manda.

Os anos se passaram e ela passou a olhar para aquela criança com outros olhos. Não caro leitor, não foi o olhar maternal, mas sim o olhar de um lobo que espera a presa cair para atacar. Ela sentia vontade de tocar a menina. E ela a tocava. No começo apenas passava a mão, sentia a pele macia de sua filha, sua futura aprendiz, amante e concorrente.

Com os anos a menina cresceu e se tornou uma prostituta habilidosa e lucrativa. Mas o fato de olhar para ela fazia com que Morete se lembrasse de um passado, ou pelo menos uma parte em especial, que ela tentava esquecer. Jurara pra si mesma, que ia fazer aquela maldita menina sofrer por ter nascido e por ser tão bela despertando nela o prazer indescritível.

quarta-feira, 7 de maio de 2008

A Dívida - Parte III - Jéssica Campos

Horas se passaram, e Cátia permanecia imóvel, sentada na cadeira em frente à cama. Pensava em mil coisas. Em como iria viver após tudo aquilo, se teria coragem de matá-la e o que ela significava para si. Esperava a vadia despertar para começar com seu joguinho violento, que nem ela mesma sabia qual era, só sentia-o na veia. O seu corpo agia por conta própria.

No fundo Cátia não era assim. Mas ela precisava de muitas respostas e tinha medo. Assumiu uma pose que ela mesma não sabia de quem era, apenas recordava-a.

- O que está fazendo Cátia?
- Então você sabe meu nome? Que engraçado! Penso que você nunca o pronunciou antes. Dizia com palavras cortantes.
- Olha, não precisa se precipitar. Eu me descontrolei ontem, juro que não vai mais acontecer. Me solta agora... Filha.

Morete pronunciava tais palavras com tanta calma e doçura que por um momento quase foi solta.

Filha? Por que ela me chama assim? Cátia gravou tais palavras em sua mente que resolveu não parar até descobrir o mistério sobre sua vida.

- Vai velha desembucha.
- Desembucha o que menina?
- Quero a verdade sobre minha vida.
-Mas eu não estou te mentindo. Você é o pagamento de uma dívida e você é minha.
- Que dívida?

Um silêncio pairou sobre o ar. Ninguém falava. Em Cátia o medo de estar cometendo o maior erro de sua vida. E em Morete a dúvida sobre a verdade.

- É melhor você não saber de nada, pois só assim você vai conseguir viver. Escuta o que eu te falo.

Escute o que eu falo. A mente de Cátia girava, ela não conseguia mais raciocinar, estava exausta.

Com um impulso, pegou novamente a faca... Fincou-a na perna de Morete. Esta urrava de dor, sua agonia de estar amarrada e ferida era mais que óbvia. E só assim pode perceber que Cátia não estava brincando.

Há 18 anos Morete estava, nesse mesmo instante, dançando em uma balada qualquer. E em como toda festa beijou um carinha. O único problema era que esse rapaz não era qualquer um. E sim um traficante de baladas. O carro estava em alta velocidade, e o som de rap ecoava pelas ruas. O crepúsculo parecia lindo, e ela estava encantada com a vida. Alguns minutos se passaram e o carro parou em um beco. Lá a droga rolava solta, e a violência era eminente.

Sentaram-se em uma roda e lá ficaram fumando algumas pedras. O que parecia uma brincadeira de fim de festa se tornou um vicio.

Os anos se passaram e ela se endividou. Às vezes roubava de casa, na rua e até de igrejas para poder sanar um pouco de sua dívida. Mas uma proposta lhe foi feita, onde ela poderia pagar a dívida com o corpo. Morena, alta e magra, seios fartos e empinados, cabelos ondulados, Morete possuía um olhar gracioso e seu sorriso levava qualquer homem ao fundo da mente, se fantasiando com esta linda mulher.

- Eu não tinha muita escolha. Eu era muito jovem.

E realmente era mesmo. "Dar ou morrer", esse era o termo do contrato.

O tempo foi passando, e com ele surgiu mais drogas. A dívida só aumentava e o álcool se tornava uma fuga.

Era abusada sexualmente por vários homens. "Pague sua dívida", eles diziam. Cada vez mais acabada, magra, Morete ia ficando roxa devido às surras que levava.
Porém com o tempo ela se tornou uma mulher maldosa. Sentia prazer em fazer as pessoas sofrerem.

Mas o que ela não contava em sua vida, foi com o feto que se desenvolvia dentro de si.

terça-feira, 6 de maio de 2008

A Dívida - Parte II - Jéssica Campos

Ela nem mesmo sabia por que era obrigada a ouvir aquilo. Morete dizia-lhe que ela fora o pagamento de uma dívida, e que como agradecimento por ainda estar viva, devia satisfazer suas necessidades... E seus desejos.

Distraída, Cátia ia andando pelo funda da casa, uma casa pequena e suja. Onde a sujeira havia permanecido ali por tanto tempo que estava incrustada no chão. Pensou que Morete estivesse sonhando ou falando sozinha como sempre. O que ela mal sabia era que talvez Morete estivesse mais lúcida do que o normal.

Chegando por trás de Cátia, ela foi enfiando-lhe a mão por entre a blusa.

- Vou te mostrar como uma puta de verdade faz.

Dizem um segundo é muito tempo em determinadas situações... E realmente aquele foi o segundo mais longo da vida de Cátia.

O dia amanheceu rapidamente, as gotas de orvalho não penetravam naquela parte da cidade. A verdade é que quase nada de bom e bonito se estabelecia por ali. Era como uma regra. O negrume do lugar era mais que perceptível. Trazia um carma pesado.

Cátia acordou e pensou na possibilidade de ter sonhado, mas as marcas roxas em suas pernas mostravam que aquilo tinha sido mais real do que queria. Estava enraivecida com aquela situação. Morete já tinha feito algo parecido antes, mas ela apenas se lembrava vagamente, pois era pequena nesta época.

Ao seu lado dormia a mulher que lhe havia maltratado, violentado, humilhado e agora, estuprado. Sentia uma tristeza tão profunda, que começou a chorar. Chorava em uma velocidade que fazia com que seu peito doesse a cada vez que puxasse o ar. Seus mamilos eram empinados e branquinhos, porém graças à noite passada, estavam marcados por mordidas e doloridos.

Cátia estava em ponto de bala. Sem pensar duas vezes pegou a faca... Iria matá-la.

- Acorda sua vaca. Quero que olhe nos meus olhos enquanto eu lhe rasgo a garganta.

Morete ria desesperadamente, uma risada frenética e ensurdecedora, que no fundo causava medo.

- Menininha você não sabe quem sou, e o que significo para você. Cuidado, ou posso me irritar.
- Então vamos brincar.

E com um golpe na cabeça Morete desmaiou, dando tempo para Cátia amarrá-la.

segunda-feira, 5 de maio de 2008

A Dívida - Parte I - Jéssica Campos

Mais uma vez ela estava naquela esquina. Aquela maldita esquina, suja, fedida e escura. As outras já estavam acostumadas. Elas mesmas foram quem escolheram este caminho. Mas não ela. Ela não... Fora obrigada a seguir por este rumo e mal entendia o motivo.

Toda a noite se produzia. Colocava sua micro-saia, que ela mais considerava um pedaço de pano sobre seu órgão, passava o rimel, o blush e colocava aquela sombra delicada. Sabia que os clientes gostavam das mulheres que mais chamavam a atenção, mas com o tempo e após muitas surras percebeu que clientes que escolhiam as mais simples pela maquiagem eram os mais camaradas.

Era uma menina-mulher muito bonita por sinal. A verdade é que Cátia era tão linda quanto à mãe que ela não conhecia. Seus cabelos eram de um castanho avelã com cachos volumosos, era uma mistura de beleza. Possuía a boca fina e pequena, simples, mas vermelha. Um vermelho tão vivo que lhe trazia luz a face delicada. Nos olhos possuía uma sutileza indescritível, e quando a maldosa luz do dia fazia-lhe carinho na face, era aí que se notava o verde claro, misturado com o castanho que seus olhos possuíam. Mesmo sendo essa menina-mulher maravilhosa que era, Cátia demonstrava uma ausência e uma solidão que nem mesmo ela sabia de onde vinha.

Sempre ouvia os clientes mais dóceis brincando sobre seus cachos. "Me dá este cacho?", ou então "Que cachinho mais bonitinho". Mesmo com toda experiência sexual que possuía, onde conseguir mais clientes, como agradá-los, quais são os violentos, estava cansada de se prostituir. Cansada de ser abusada todas as noites pela mesma mulher e por não possuir a liberdade que tanto ansiava.

Naquela noite não se prostituiu, não apanhou, porém coisas mudaram em sua vida, e ela mal sabia o que a esperava na volta para o moquifo que ela chamava de lar.

- Onde está minha droga sua putinha barata? Onde você escondeu? Eu vou te matar.

Mais uma vez ela está delirando, pensou Cátia enquanto passava pela janela de frente a sala.

Quase sempre era a mesma coisa, Morete se drogava, usando a grana de Cátia. Grana que ela juntava dando pra várias pessoas, o que era sempre alguns míseros trocados.

- Você me deve mais do que drogas e grana menininha. Você é mais que uma dívida. Você é minha!

Aquelas palavras eram irritantes.

Mudanças de Vida - Carta ao Leitor - Renato Seabra


A princípio gostaria de agradecer ao Paulo e ao Daniel, que se esforçaram também em prol deste projeto dar certo. Acredito que virão ainda muitas surpresas e estou feliz por eu ter me adaptado a mais um projeto que, como Paulo disse, estava na "gaveta".

Pela ilustração feita por Daniel, horas de madrugadas desenhando e Paulo e eu editando, estou muito satisfeito. Espero que isso esteja contribuindo para o próprio desenvolvimento de todos.

Como Paulo também disse, o projeto "Contos de Sangue" prometia ser um livro. Apesar deste modo que estamos exibindo os contos, ainda espero que este projeto dê certo como livro, realmente.

Quero agradecer os elogios e a paciência daqueles que estão acompanhando o desenrolar de nossos contos.

Até um próximo conto!

-- Renato Seabra

domingo, 4 de maio de 2008

Mudanças de Vida - Parte VI - Renato Seabra

Elias a agarra e a puxa pra cima, forçando-a a ficar de pé. Subitamente parando de rir, Kelly grita tentando se arrastar pelo chão. Três disparos. Um segundo. Uma vida inteira muda. Kelly, ainda em pé por estar nos braços de Elias, se deixa levar. E ele percebe sua fraqueza. Tenta entender o que acontece, olha para todos os lados. Há alguns carros que estão passando ao lado ignorando-os. Ele se desespera e grita pelo nome dela.

Ele tenta entender o que acontece, olha para si próprio. Há alguns sentimentos direcionados para ela. Uma imagem dela jovem e sorridente invade sua mente. Em frações de segundos passa toda a vida que teve com ela. Ele se lembra até da chuva que tomaram juntos, na rua, enquanto passeavam. Como ficaram ensopados e davam muitas risadas e trocaram os primeiros beijos. Agora somente sua mão está ensopada e com o sangue dela escorrendo pela sua cabeça e barriga. Elias, entregue à situação, chora por um momento até ouvir uma sirene de um carro de polícia se aproximando. Totalmente em dúvida do que fazer e dominado pelo instinto de sobrevivência, se levanta e foge.

Porém, inconsciente, corre de volta até sua própria casa. Ao chegar lá, abre a porta, entra e a fecha. Olha para a casa em que mora. Parece lembrar-se da casa em que morava Kelly ainda na época com a família. Lembra-se da própria casa. De seu pai e de sua mãe. Irmãos. Alguns amigos. Todos morreram. A história é grande demais para ele suportar de uma vez. Ele tropeça pelo chão. Cada objeto que toca lhe lembra algo. Tudo se foi. Como é possível ter construído uma vida assim. Não... Isso não é construção... Isso não é vida. Elias busca cigarros e bebidas enquanto se arrasta pelo chão. Agarra seu maço de cigarros e então se lembra de quem lhe ensinou a fumar. Não mais suporta. Fecha os olhos e aceita desmaiar.

Ao acordar, Elias está na delegacia. Há um policial esperando-o acordar.

- Ei... Você! Está bem, cara? - Pergunta o policial.
- É... Estou sim. - Responde Elias.
- Então vamos direto ao assunto.

Um silêncio. O policial olha para o lado e chama alguém.
Entra outro policial. Ele se encosta à cadeira. Seu nome é Camilo. Elias recupera um pouco de sua postura que havia perdido.

- É... Vamos começar de talvez onde você possa entender... Tem preferência? - Pergunta Camilo.
- Fale o que quiser. - Responde Elias.
- Kelly.
- Ela morreu então?
- Não se faça de sentimental, Elias. Nós te conhecemos muito bem e temos prisioneiros aqui sedentos por sua cabeça. Não brinque com a gente.
- Ela não era nada pra mim e só um brinquedo para os outros.
- E você está certo numa outra coisa. Ela morreu sim. Porém temos testemunhas que dizem que a ultima pessoa que estava com ela era você mesmo.
- Sim. Eu a levava até o mercado, como ela havia me pedido.
- E disseram também que você a agrediu no meio da rua.
- Sim. Senti vontade de espancá-la e não seguro vontades. Não faz bem a saúde.
- Estou vendo como isso compensa os seus cigarros e bebidas.
Elias não responde.
- Sabemos que não foi você, Elias. Não está aqui para se defender.
- Sabem que não fui eu? Oras... Eu nem iria me interessar em me defender. Podem fazer o que quiserem.
- Estou vendo que não te interessa chegar até a verdade. Mas precisamos de sua ajuda.
- Eu? Ajudando a polícia de novo? Não me parece um bom acordo.

O policial respira fundo. Olha para o lado e dá um sinal.

Um minuto se passa e dois policiais aparecem segurando um prisioneiro chamado Victor. "Elias! O que você faz aqui seu filho da puta?! Você me paga! Eu te mato ainda!" E continua gritando sem parar a mesma coisa enquanto ele é levado de volta à força por quatro policiais. Victor é grande. Forte. Porém não muito esperto. Seu conhecimento sobre o mundo não ultrapassa as poucas palavras que acabou de pronunciar.

Pelo menos Elias acredita que ele não é esperto. Mas ele tem uma dívida enorme com Victor que, se este estivesse livre, iria transformá-lo num brinquedo pelo resto da vida.

- Então, Elias? Temos um acordo? - Pergunta o policial.
- O que vai ser? - Pergunta Elias, mais interessado.
- Sabemos quem a matou. É um assassino de aluguel.
- Qual o nome dele? Não conheço todos.
- Então conhecerá o melhor deles. Pois este negocia bem os preços com quem o procura, além de ter muitas estratégias.

Elias conversa na delegacia por mais de três horas e é totalmente preparado para o plano.

A polícia, para facilitar, realiza seu sonho de morar naquele prédio que ele tanto quisera antes. Este é o primeiro passo do plano.

FIM.

Mudanças de Vida - Parte V - Renato Seabra

Já é de manhã. Outro dia de trabalho promete ser puxado para Kelly, mas não para Elias. Ele continua no sofá do mesmo jeito e com cinzas de cigarro nos dedos e a maioria no chão que deixou cair, sem ter tido forças para puxar o ultimo trago que há muito tempo já havia abandonado a vontade.

Ela se aproxima cautelosamente e observa que uma barata esta na orelha de Elias. Ao tentar matá-la, a barata corre para dentro da camiseta dele. Não tendo a mínima paciência, Kelly localiza onde está a barata, a segura pela camisa com uma das mãos e com a outra a torce como um pano molhado, a barata é amassada e libera um liquido amarelo, manchando a camiseta e grudando nas mãos dela. Ela solta a camiseta e gruda no corpo de Elias, fazendo com que ele movimente seus dedos e deixando o cigarro cair no chão. Kelly deita-o no sofá para que ele possa dormir de algum jeito. Elias não resiste ao seu doce toque. Uma lembrança de carinho passa em sua mente e parece aquecê-lo. Ele sabe que algo está acontecendo, mas sente seu corpo cair como há quilômetros de altura.

Kelly se encontra com outro cliente em sua casa chamado Otávio. Homem muito rico e poderoso na cidade. Ele diz a ela que fornecerá tudo que precisar para ela se livrar de Elias. Porém, Kelly diz para ele não se preocupar que estará muito ocupada a noite. Otávio vê Elias deitado no sofá. "Que criatura mais desprezível. Como pode agredir uma mulher?". Otávio se despede de Kelly, deixando um pouco de drogas e dinheiro pra pagamento.

Já é noite e Elias é acordado por Kelly.

Ele reflete um pouco sobre alguns sonhos estranhos que teve, mas não liga muito pra isso. Há muito tempo abandonou seus sonhos.

- Oh! Acorda ai. Levanta! - Fala Kelly.
- O que você quer? - Reclama Elias.
- Preciso ir até o mercado e não vou sozinha a esta hora.
- Que se dane. Eu não preciso de nada.
- Você sabe que é perigoso andar agora! Vamos lá! Você sempre foi!
- Mas é uma cretina mesmo. Por que não foi mais cedo?
- Eu trabalho, esqueceu? E você, que nem trabalha e só sabe dormir?
Elias se levanta irritado.
- Você que deveria ter ido faz tempo. - Ainda falando Kelly.
- Cale a boca. Vamos logo. Pegue o maldito dinheiro.
"Vou comprar uns cigarros pra mim" Elias pensa.
- Está aqui! E é do meu trabalho, está bem?

Elias tira da mão dela e guarda o dinheiro no bolso de sua calça e sai primeiro pela porta. Deixando Kelly fechando a casa e seguindo-o. Elias pensa em como tudo isso poderia ser diferente, mas sua visão de uma vida melhor é tão limitada que esse pensamento não durou nem três segundos. Elias se vê um pouco sentimental esta noite. Não sabe o que acontece. E como não sabe interpretar, considera isso apenas mais uma de suas muitas confusões.

Eles chegam até uma rua que tem um parque ao lado. De frente há um prédio grande e bem bonito. Há poucas janelas acesas. Elias até mesmo gostaria muito de morar lá se tivesse dinheiro. Kelly observa o parque. Dois sentimentos a invadem. O amor e o ódio. A sua decisão seria agora. Ela amou Elias há muito tempo e o odeia pelo que fez com a sua vida, ou seja, também há muito tempo. Ela deseja vingança. Como ela gostaria de ter filhos. Como ela gostaria de ter uma casa decente. Ela pensa em como gostaria de ter outras coisas, mas também, assim como Elias, já se esqueceu de tudo isso. Seus sonhos foram esquecidos no meio do caminho da vida. Ela deseja vingança. Só isso. "Só isso!" ela suspira. Elias olha para ela sentindo que foi chamado.

- Está olhando o prédio, é? - Pergunta Kelly, insinuando alguma coisa.
- Hum... Não posso olhar também?
- Não, não. Só estou vendo como você sonha a toa, seu imbecil!

Kelly fala isso e pára de andar.

- Do que está falando? - Pergunta Elias.
- Que você é um imbecil? É surdo também?
- Você fumou alguma coisa? Está louca?
- O que você vai fazer seu fracassado?

Kelly, ao pronunciar estas palavras com muito ódio, também as pronuncia com muitos risos e altos. Era óbvio de que se tratava de uma risada falsa, devido a não ter motivos para uma verdadeira há muito tempo. E Elias sabia disso. Sabe que era falsa, não só a risada, mas ela por completo.

- Pare de me humilhar!

Elias, pensando somente em como ele estava sendo humilhado, vai agressivamente pra cima de Kelly sem que ela possa se defender e estranhamente se joga no chão. Elias fica de pé, vendo-a se arrastar sozinha pelo chão como tem feito por toda a vida diante de muitos homens, menos diante dele próprio. Kelly não pára de rir. A pergunta de Elias sobre ela ter fumado alguma coisa parece ser positiva. Nunca a havia visto neste estado excêntrico.


sábado, 3 de maio de 2008

Mudanças de Vida - Parte IV - Renato Seabra

Kelly entra no bar. Bancos de couro, boa iluminação, um garçom no meio e garçonetes entregando alguns pedidos. E lá está o homem. "É óbvio que está escondendo alguma coisa" ela pensa. "Não tem como não saber que é ele" ela acredita.

Ela caminha até ele. Há um banco vazio. Senta diante dele. Eles se olham. Ela se senta um pouco incomodada por estar ali. Não quis dizer a Gabriel, mas ela nunca aparece por lá sem companhia. Foi por isso que ela perguntou a ele se seria "Chegar e falar" com ele. Porém, pelo pouco que ela observou não há nenhum perigo.

- É... - Tenta falar Kelly - É... Eu moro com um homem que...
- Sei. Seu marido te espanca.
- Hum! Isso... E quero que você...
- E quer que eu o mate pra você.
- É... Quanto... Quanto vai...
- Depende de como vai pagar. Mas isso nós podemos deixar pra depois.
- Como pode saber de tudo isso?
- Não devo essas respostas a você.

Kelly ouve atentamente o plano e o aceita. Não parece difícil.

Kelly, sozinha, sai do bar após uma hora e meia. Meia hora de explicação e uma hora de pagamento adiantado. Está muito escuro e poucas pessoas na rua. Sente muito frio. Tenta pensar em um lugar para passar a noite, mas não consegue pensar em nenhum outro senão a própria casa. Ela não queria voltar lá tão cedo.

Quando Elias acorda não sabe de muitas coisas. Parece ter perdido sua consciência, mais uma vez. Ele olha para os lados, reconhece onde mora, tenta perder a consciência novamente, mas não consegue. E em algum tempo se levanta.

Toma um banho frio. Prepara um café. Parece estar um pouco mais atento.

Senta em seu sofá, liga a televisão e lá, sem pretender, passaria a vida toda se necessário sem ao mínimo perceber sua decomposição. Morte declarada. Seu único movimento era mover o braço e as mãos para ascender um cigarro e fumar e depois ascender o outro. Fumar e ascender o outro. Fumar e ascender o outro...

Kelly chega lentamente a sua casa. Percebe que a porta está fechada e acha isso estranho, pois havia deixada aberta. Logo percebe que Elias está sentado, mas sem medo entra normalmente, como se nada houvesse ocorrido. Ela o vê ali naquele estado hipnotizado e começa a se trocar na frente dele. Lentamente Elias é atraído pelo som do zíper da calça de Kelly abrindo-se, acompanhado de alguns movimentos sensuais de seu corpo. Os estalos que ela força acontecer enquanto tira seu sutiã faz com que Elias fique um tanto curioso, mas parece ter perdido o interesse ao ver essa cena. Ela fica totalmente nua, ergue lentamente a perna, exibindo-a, soltando levemente a calcinha por entre os tornozelos e passa diante e bem perto de Elias movimentando suas curvas. Ele a olha, mas a despreza totalmente.

Kelly tentou nessa hora humilhá-lo, mas acabou se sentindo desvalorizada por um momento. Porém, como ela mesma já se desvalorizou há muito tempo, não fez tanta diferença. Pelo menos tudo isso foi o que passou pela mente dela. Pois Elias nem ao menos estava enxergando alguma coisa quando olhava para os lados. Totalmente inconsciente.
Sem mais o que fazer e morrendo de ódio e ansiedade, ela vai deitar-se. Sem mais o que fazer como durante toda a vida, ele continua por ali mesmo.

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Mudanças de Vida - Parte III - Renato Seabra

Kelly se acalma e se alegra ao vê-lo.

- Ahh! Oi amor! Tudo bem? - Ela grita.
- Olá minha querida... Você me ligou?
- Humf! Você nem imagina...
- O que houve? Você... Está machucada?! Quem fez isso?
- Calma meu amor. Foi aquele idiota do Elias. Ele...
- O que ele fez pra você? Ele te agrediu?
- É... Ele me bateu um pouco...
- Eu vou acabar com ele agora...
- Não precisa... Eu bati na cabeça dele com um pedaço de pau e ele está desmaiado agora...
- Ele vai pagar por isso ainda.
- Eu sei que vai.
- Quer sair daqui?
- Claro...

O cara entra no carro e Kelly caminha até o outro lado, onde um capanga, pequeno e encapuzado, como alguns outros, abre a porta pra ela entrar.

Ele liga o carro e os três carros começam a andar pela cidade juntos.

- Então... Ele te agride faz tempo?
- Sim, senhor Gabriel. Não adianta fingir que você não sabe.
- Como assim?
- Você sempre me viu com alguns machucados. Não adianta dizer que não.
- É. Aquele desgraçado. Só não o matei por sua causa, não queria te deixar triste ou te causar problemas.
- Eu estou cansada dele já.
- Se está mesmo, eu posso te dar uma solução pra isso.

Os olhos de Kelly parecem brilhar ao ouvir isso.

- Tem um cara. Ele quase sempre está naquele bar famoso, em frente ao parque... Sabe?
- Sei, sei... E daí?
- Fale com ele. Ele cobra para matar, mas não é caro e pode te oferecer todo um plano para isso ocorrer e você sai totalmente sem culpa.
- Hum... Qual o nome dele?
- Sinto muito. Não posso falar assim. Você saberá que é ele. É muito acessível. Ao entrar no bar, veja quem está sentado quase ali no meio, vestindo uma espécie de casaco antigo, entende?
- Casaco antigo?
- Isso. É um cara com um estilo próprio. Está sempre bebendo alguma coisa por lá.
- Ele é fácil assim? Chegar e falar?
- Claro. Vou te deixar lá na entrada. Só não diga que eu te indiquei. Simplesmente chegue falando. Ele não se importa como você soube dele.

Kelly sente um tom de imposição nas palavras de Gabriel, mas sem muita alternativa naquela hora, "Pode ser..."

Kelly vai pensando muito sobre o próximo fim de Elias. Ela por alguns poucos segundos sente saudades dele, mas como não sabe a origem disso, é levada pelo gosto da vingança. E origens disso não faltavam.

Eles dão uma volta pela cidade. Chegam até o bar. O local é bem cuidado, pois é uma parte do bairro bem mantida pelo governo. Há muitos prédios bonitos ao redor e a rua é muito bem iluminada.

- É aqui querida. Ele deve estar aí.
- Ok, meu bem! Vou falar com ele então! Até mais tarde!
- Tchau. Se cuida. Ligue-me se precisar.Enquanto se despedem, eles trocam alguns beijos e Kelly sai do carro. Logo ela se lembra que não tem mais celular.