segunda-feira, 5 de maio de 2008

A Dívida - Parte I - Jéssica Campos

Mais uma vez ela estava naquela esquina. Aquela maldita esquina, suja, fedida e escura. As outras já estavam acostumadas. Elas mesmas foram quem escolheram este caminho. Mas não ela. Ela não... Fora obrigada a seguir por este rumo e mal entendia o motivo.

Toda a noite se produzia. Colocava sua micro-saia, que ela mais considerava um pedaço de pano sobre seu órgão, passava o rimel, o blush e colocava aquela sombra delicada. Sabia que os clientes gostavam das mulheres que mais chamavam a atenção, mas com o tempo e após muitas surras percebeu que clientes que escolhiam as mais simples pela maquiagem eram os mais camaradas.

Era uma menina-mulher muito bonita por sinal. A verdade é que Cátia era tão linda quanto à mãe que ela não conhecia. Seus cabelos eram de um castanho avelã com cachos volumosos, era uma mistura de beleza. Possuía a boca fina e pequena, simples, mas vermelha. Um vermelho tão vivo que lhe trazia luz a face delicada. Nos olhos possuía uma sutileza indescritível, e quando a maldosa luz do dia fazia-lhe carinho na face, era aí que se notava o verde claro, misturado com o castanho que seus olhos possuíam. Mesmo sendo essa menina-mulher maravilhosa que era, Cátia demonstrava uma ausência e uma solidão que nem mesmo ela sabia de onde vinha.

Sempre ouvia os clientes mais dóceis brincando sobre seus cachos. "Me dá este cacho?", ou então "Que cachinho mais bonitinho". Mesmo com toda experiência sexual que possuía, onde conseguir mais clientes, como agradá-los, quais são os violentos, estava cansada de se prostituir. Cansada de ser abusada todas as noites pela mesma mulher e por não possuir a liberdade que tanto ansiava.

Naquela noite não se prostituiu, não apanhou, porém coisas mudaram em sua vida, e ela mal sabia o que a esperava na volta para o moquifo que ela chamava de lar.

- Onde está minha droga sua putinha barata? Onde você escondeu? Eu vou te matar.

Mais uma vez ela está delirando, pensou Cátia enquanto passava pela janela de frente a sala.

Quase sempre era a mesma coisa, Morete se drogava, usando a grana de Cátia. Grana que ela juntava dando pra várias pessoas, o que era sempre alguns míseros trocados.

- Você me deve mais do que drogas e grana menininha. Você é mais que uma dívida. Você é minha!

Aquelas palavras eram irritantes.

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