domingo, 4 de maio de 2008

Mudanças de Vida - Parte VI - Renato Seabra

Elias a agarra e a puxa pra cima, forçando-a a ficar de pé. Subitamente parando de rir, Kelly grita tentando se arrastar pelo chão. Três disparos. Um segundo. Uma vida inteira muda. Kelly, ainda em pé por estar nos braços de Elias, se deixa levar. E ele percebe sua fraqueza. Tenta entender o que acontece, olha para todos os lados. Há alguns carros que estão passando ao lado ignorando-os. Ele se desespera e grita pelo nome dela.

Ele tenta entender o que acontece, olha para si próprio. Há alguns sentimentos direcionados para ela. Uma imagem dela jovem e sorridente invade sua mente. Em frações de segundos passa toda a vida que teve com ela. Ele se lembra até da chuva que tomaram juntos, na rua, enquanto passeavam. Como ficaram ensopados e davam muitas risadas e trocaram os primeiros beijos. Agora somente sua mão está ensopada e com o sangue dela escorrendo pela sua cabeça e barriga. Elias, entregue à situação, chora por um momento até ouvir uma sirene de um carro de polícia se aproximando. Totalmente em dúvida do que fazer e dominado pelo instinto de sobrevivência, se levanta e foge.

Porém, inconsciente, corre de volta até sua própria casa. Ao chegar lá, abre a porta, entra e a fecha. Olha para a casa em que mora. Parece lembrar-se da casa em que morava Kelly ainda na época com a família. Lembra-se da própria casa. De seu pai e de sua mãe. Irmãos. Alguns amigos. Todos morreram. A história é grande demais para ele suportar de uma vez. Ele tropeça pelo chão. Cada objeto que toca lhe lembra algo. Tudo se foi. Como é possível ter construído uma vida assim. Não... Isso não é construção... Isso não é vida. Elias busca cigarros e bebidas enquanto se arrasta pelo chão. Agarra seu maço de cigarros e então se lembra de quem lhe ensinou a fumar. Não mais suporta. Fecha os olhos e aceita desmaiar.

Ao acordar, Elias está na delegacia. Há um policial esperando-o acordar.

- Ei... Você! Está bem, cara? - Pergunta o policial.
- É... Estou sim. - Responde Elias.
- Então vamos direto ao assunto.

Um silêncio. O policial olha para o lado e chama alguém.
Entra outro policial. Ele se encosta à cadeira. Seu nome é Camilo. Elias recupera um pouco de sua postura que havia perdido.

- É... Vamos começar de talvez onde você possa entender... Tem preferência? - Pergunta Camilo.
- Fale o que quiser. - Responde Elias.
- Kelly.
- Ela morreu então?
- Não se faça de sentimental, Elias. Nós te conhecemos muito bem e temos prisioneiros aqui sedentos por sua cabeça. Não brinque com a gente.
- Ela não era nada pra mim e só um brinquedo para os outros.
- E você está certo numa outra coisa. Ela morreu sim. Porém temos testemunhas que dizem que a ultima pessoa que estava com ela era você mesmo.
- Sim. Eu a levava até o mercado, como ela havia me pedido.
- E disseram também que você a agrediu no meio da rua.
- Sim. Senti vontade de espancá-la e não seguro vontades. Não faz bem a saúde.
- Estou vendo como isso compensa os seus cigarros e bebidas.
Elias não responde.
- Sabemos que não foi você, Elias. Não está aqui para se defender.
- Sabem que não fui eu? Oras... Eu nem iria me interessar em me defender. Podem fazer o que quiserem.
- Estou vendo que não te interessa chegar até a verdade. Mas precisamos de sua ajuda.
- Eu? Ajudando a polícia de novo? Não me parece um bom acordo.

O policial respira fundo. Olha para o lado e dá um sinal.

Um minuto se passa e dois policiais aparecem segurando um prisioneiro chamado Victor. "Elias! O que você faz aqui seu filho da puta?! Você me paga! Eu te mato ainda!" E continua gritando sem parar a mesma coisa enquanto ele é levado de volta à força por quatro policiais. Victor é grande. Forte. Porém não muito esperto. Seu conhecimento sobre o mundo não ultrapassa as poucas palavras que acabou de pronunciar.

Pelo menos Elias acredita que ele não é esperto. Mas ele tem uma dívida enorme com Victor que, se este estivesse livre, iria transformá-lo num brinquedo pelo resto da vida.

- Então, Elias? Temos um acordo? - Pergunta o policial.
- O que vai ser? - Pergunta Elias, mais interessado.
- Sabemos quem a matou. É um assassino de aluguel.
- Qual o nome dele? Não conheço todos.
- Então conhecerá o melhor deles. Pois este negocia bem os preços com quem o procura, além de ter muitas estratégias.

Elias conversa na delegacia por mais de três horas e é totalmente preparado para o plano.

A polícia, para facilitar, realiza seu sonho de morar naquele prédio que ele tanto quisera antes. Este é o primeiro passo do plano.

FIM.

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